domingo, 22 de abril de 2007

Miguel Silvestre

Dois anos depois de se licenciar em Ciências Farmacêuticas, e após um estágio na indústria farmacêutica, na Eurolabor, em Condeixa-a-Nova, Miguel Silvestre ingressou na Farbeira Crl, onde, entre Março de 1992 a Setembro de 1994, desempenhou os cargos de director comercial e de director técnico. Em 1994 adquire uma farmácia em Góis e estabelece-se como farmacêutico de oficina. “Esta é a minha actividade principal e aquela que me preenche enquanto farmacêutico”, afirma, sublinhando que é muito aliciante “ser farmacêutico num meio pequeno, onde se está próximo da comunidade e se conhece toda a gente”.
Em 1998 Miguel Silvestre integra uma lista candidata aos órgãos sociais da Farbeira e assim regressa à cooperativa de distribuição farmacêutica, primeiro como director e partir de 2000, e até à data, como presidente da direcção. “A Farbeira foi a escola da minha vida, quer como homem, quer como profissional, e daí o facto de ter acedido a este desafio e ter regressado”, explica o farmacêutico, que desde Setembro de 2000 é também presidente da Delegação do Centro da Associação Nacional de Farmácias (ANF).
“Tenho um conjunto de actividades que preenche o meu dia-a-dia, mas é sobretudo uma questão de organização, de nos prepararmos e planearmos o dia seguinte e a semana seguinte”, considera Miguel Silvestre. Assim, um dia por semana é dedicado inteiramente à Farbeira; nos outros procura concentrar as actividades no início da manhã ou no final do dia, de modo a ter tempo para estar na farmácia. “Tenho farmacêuticos a trabalhar comigo para colmatar as minhas ausências, mas consigo estar muito presente na farmácia, junto dos utentes”. Claro que “o dia de trabalho acaba por ter 10 ou 12 horas, para conseguir chegar a todo o lado. Mas faço-o porque quero, com todo o prazer, e posso dizer que tenho o privilégio de fazer aquilo de que gosto”, afirma.
Há quase uma década em funções directivas na Farbeira, Miguel Silvestre impulsionou o processo de fusão que levou à criação, em 2006, da Farbeira-Cofarbel-Farcentro, que se tornou a quarta maior empresa do sector, detendo cerca de 9% do mercado. “As empresas maiores estavam a crescer, as multinacionais a entrar no país, tínhamos que nos reestruturar”, justifica. Enquanto cooperativa de distribuição farmacêutica a Farbeira era a empresa líder do sector no Centro. “Mas era líder à dimensão da região, onde, estando implantada nos seis distritos, tinha como associados pouco mais que 600 farmácias, afinal o número das que existem em Lisboa”, acentua.
A fusão “é apenas um passo, dá-nos outra capacidade de crescer e o futuro será aquele que for o melhor para os nossos associados e para a região em que estamos inseridos”, considera Miguel Silvestre, frisando, contudo, que “a estratégia passa por atingir dimensão nacional”. A Farbeira-Cofarbel-Farcentro já entrou nos dois grandes mercados do país: abastece o Porto a partir do armazém de Eiras, em Coimbra, onde está sediada a empresa; a Lisboa chega através do armazém da Farmoeste, nas Caldas da Rainha, outra empresa do grupo. Este ano a grande aposta é a construção de um novo armazém na zona industrial da Covilhã, que abastecerá a zona interior, desde Bragança e Vila Real e até Portalegre, e que representa um investimento de cerca de 500 mil euros.
A Delegação do Centro da ANF desenvolve um trabalho associativo local, com as farmácias e entidades representativas da classe, seguindo a actividade protagonizada a nível nacional. “A ANF tem um trabalho associativo meritório, por muito que custe a algumas pessoas se calhar é o maior exemplo de sucesso associativo no país”, afirma Miguel Silvestre. E essa “capacidade de organização é considerada ameaçadora”, repara o farmacêutico, admitindo alguma apreensão quanto ao futuro, devido a algumas decisões do Governo, como a intenção de liberalizar a propriedade da farmácia. “Com problemas tão graves na área da Saúde foi identificada esta necessidade, que nem sequer constava do programa do Governo. E não percebemos porquê, porque não existem reclamações e os inquéritos revelam a satisfação dos utentes quanto ao papel das farmácias”, sublinha.
“A farmácia portuguesa é reconhecida na maioria dos países europeus como um exemplo e a ANF defende os interesses legítimos dos seus associados, com grande capacidade de organização”, afirma Miguel Silvestre. Até “devia ser um exemplo”, defende, acentuando que em 30 anos se organizou o sector das farmácias, que então tinham “profissionais desmotivados, espaços obsoletos e dependiam dos armazenistas”.
De resto, realça, “a maioria dos países europeus adoptou um modelo de organização de farmácia idêntico ao de Portugal”, onde existe uma farmácia por cada 3.700 portugueses, isto é, “temos critérios de capitação, o que não acontece com outras profissões”.
“A liberalização da propriedade das farmácias pode pôr em causa a independência profissional, que a Ordem dos Farmacêuticos continua a tentar salvaguardar, e no futuro poderá inviabilizar algumas acções, como as campanhas de intervenção comunitária gratuitas que hoje se fazem”, considera o dirigente da ANF. “Nós estamos preparados para o que vier a acontecer e quem vai perder, mais do que os farmacêuticos proprietários de farmácias, que é quem se queria atingir, é o país, os utentes, a saúde pública”, afirma.
“As medidas não são tomadas com base em estudos de evidência”, critica o farmacêutico, considerando que foi o que aconteceu com os medicamentos não sujeitos a receita médica. “Esse mercado continua em 98% nas farmácias, segundo dados do Infarmed, portanto não havia problemas de acessibilidade, e os preços até aumentaram”.
Miguel Silvestre é também accionista e membro do conselho de administração da Bluepharma - Indústria Farmacêutica SA, uma unidade que foi adquirida há seis anos por um grupo de farmacêuticos de Coimbra à Bayer. “É um projecto que tem vindo a crescer e que nos orgulha imenso e deve orgulhar a cidade e a região”, afirma, notando que este é o projecto a cuja gestão está menos ligado no dia-a-dia. “Fizemos um grande investimento na área da investigação e desenvolvimento, criámos novas valências e 50% da nossa produção já é exportada para os principais países da Europa”. Em paralelo, o número de postos de trabalho cresceu de cerca de 50 para mais de 100. “Fizemos um percurso muito interessante, para esta não ser mais uma fábrica a fechar em Coimbra”, afirma Miguel Silvestre.
in Diário As Beiras, de 21/04/2007

Etiquetas: