sábado, 31 de janeiro de 2009

Regionalismo goiense: do apego à terra e da nostalgia ao fantasma separatista (I)

- A Casa do Concelho de Góis enquanto dispositivo psico-afectivo ou melhorar a vida

1. As minhas palavras inaugurais nesta sessão solene destinam-se a saudar a Câmara Municipal de Góis pela organização desta iniciativa, o que faço na pessoa do seu Presidente, senhor José Girão Vitorino, bem como do Presidente da Assembleia Municipal, Dr. José António Carvalho. Naturalmente que, elegendo estes dois autarcas como primeiros destinatários das minhas saudações, em virtude das altas funções em que pelos eleitores foram investidos, através deles pretendo também incluir todos os representantes autárquicos dos Povos de Góis, aqueles que, no terreno e nos quotidianos, se envolvem e empenham em melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, seja como vereadores ou deputados municipais, seja nas Assembleias de Freguesia, nas qualidades de deputados locais, presidentes ou vogais. Mais do que uma mera e formal expressão de cumprimentos, permitam que este seja ainda um momento afectivo, pelo regresso às origens que permite.
Efectivamente, de cada vez que me formulam convites para vir a Góis, apercebo-me, na imediata aceitação, que os apelos emocionais pesam mais do que as agendas e que há silêncios, ou melhor, palavras convertidas pelo Tempo e pela nostalgia, que falam mais forte, um pouco como a brisa do entardecer: falam, tocam, convocam e provocam. Agradeço, pois, este convite que me endereçaram - e do qual estão atempo de se arrependerem... -, que é muito gratificante e reconfortante.
2. Mas não seria justo restringir esta saudação inicial - talvez iniciática, também - sem me referir a todos quantos, ao longo dos decénios progressos, desde que o Poder Local se instituiu em realidade no Estado de Direito democrático, desempenharam cargos autárquicos, tantas e tantas vezes desprovidos de meios, materiais, técnicos, humanos, apenas imbuídos de uma indomável vontade de vencer e de contribuir para que a vida dos seus concidadãos fosse menos dura e menos dolorosa. Seria impossível mencionar todos os autarcas que se embrenharam nesses percursos de combate e mudança: recordarei apenas os antigos Presidentes da Câmara, reputando-os símbolos maiores dessas gerações de Homens e Mulheres de boa vontade: o Fernando Carneiro, Amigo de longa data dos meus pais, companheiro de tantas lutas e conspirações, forjadas na amizade cúmplice e solidária, que me habituei a ver sempre por perto, sempre bem disposto e optimista, mesmo quando não parecia haver espaço para optimismos; primeiro Presidente após Abril, primeiro regionalista eleito para a função, quando as verbas da CEE ainda não tinham feito a sua aparição neste recanto europeu e a pobreza parecia ser o destino fatal dos Portugueses, mais dos que habitam no interior; o senhor Vítor Nogueira Dias; o Eng. Augusto Nogueira Pereira; e dr. José Cabeças, personalidades distintas, quer pela cronologia quer pelas formações, todos credores do reconhecimento público pelo que fizeram e pelo que tentarem fazer em prol de Góis e das suas gentes.
3. Versando esta Sessão sobre o papel da Casa do Concelho de Góis no reforço do movimento regionalista, é de elementar justiça apresentar, aqui e agora, uma saudação especial à instituição, na pessoa daqueles que, presentemente, a governam, muito particularmente o seu Presidente da Direcção, senhor José Dias Santos, regionalista dedicado e devotado à causa, a quem a Casa e as pessoas desta terra muito devem. É consabido que a justiça da História nunca é rápida: por isso, demorará, porventura, a reconhecer-se o que a Casa e os Povos de Góis devem a José Dias Santos, que ao longo dos últimos anos, com um pequeno núcleo de Mulheres e Homens, tem sabido conduzir a Casa em tempos eivados de dificuldades, desmotivações e ausência de obreiros.
Mas em José Dias Santos traduz-se também o espírito de todos quantos, desde 1954, o antecederam nas lutas regionalistas deste nosso concelho: muitos que já rumaram para outros Orientes, muitos que ainda estão entre nós, todos embrenhados em passar às gerações vindouras uma terra melhor, com uma vida mais digna, com horizontes mais alargados, com esperança, pelo menos em que algum dia houvesse lugar para a esperança. Mencionarei tão-só aqueles que tive o privilégio de conhecer, quer nas andanças da Casa quer no convívio familiar - e deixem que vos confidencie que, por vezes, era difícil destrinçar uma de outra das estações! Assim, o Dr. Alfredo Simões Travassos, Advogado das velhas gerações da advocacia lisboeta, no que de válido e sério esta asserção traduz, primeiro Presidente da Assembleia Geral da Casa, cargo que durante mais de vinte anos ocupou, com empenho e elegância, a quem fiquei a dever, entre outras referências, o meu estágio de advogado, após a primeira escolha académica que fiz e que depois, abandonei; o Prof. Engenheiro Carlos Baeta Neves, o mais entusiástico Presidente do Conselho Regional, por mais de vinte anos Homem de saber e de grandes causas, mais tarde Presidente da Assembleia Geral; o Eng Manuel Nogueira Ramos, que conheci na Casa em exercícios em que já se notava a falta de gente disponível, mas que esteve sempre presente e se dedicou à causa com uma energia inquebrantável; o Fernando Carneiro, a quem já aludi como um regionalista de grandes iniciativas, de que o Colégio terá porventura sido a causa maior, o Eng Rui Cortez, também um dos grandes pilares para que a obra do Colégio tivesse conhecido a luz do dia; o Francisco Barata Dias, Amigo que conheci um criança; com o qual passei muitas horas no dealbar da adolescência, de alguma forma co-mentor das minhas convicções políticas, com quem aprendi a firmeza das convicções e a abnegação que se deve ter quando se acredita - ainda que a Terra pareça girar ao contrário, como na canção do Nuno Guerreiro; o Frederico Nogueira Carvalho, também integrante do grupo com quem mais privei, quando deambulava pela mão dos meus pais, aqui, em Góis, ou em Lisboa; o Ramiro Carneiro de Matos, outra referência grande das lutas regionalistas, cujo empenho foi notável; o Claúdio Campos Nogueira, também habitual nos espaços do regionalismo efectivo e do regionalismo dos afectos, presença constante nas memórias da minha casa; o Silvano Baptista de Almeida, a quem coube o encargo de reorganizar a Casa, em 1977; o Claudino Alves de Almeida, figura grande do regionalismo, cujas apreciações precisas e rigorosas lhe granjearam a consideração de todos os regionalistas; o José de Matos Cruz, dedicado goiense, devotado regionalista, edil, Homem de crenças enraizadas, que geriu a Casa durante mais de 19 anos, a maior presidência da Casa concelhia; participámos ambos numa Direcção, em 1975, aí iniciando uma amizade até ao seu decesso; o Conselheiro Octácio Dias Garcia, figura do maior prestígio na vida portuguesa e que, praticamente até ao fim da vida, participou das actividades da Casa, onde o encontrei várias vezes, mantendo o prazer das conversas sobre a actualidade; e, entre aqueles que já rumaram para algures, compreendam que deixe duas referências afectivas e marcantes: ao meu tio, Joaquim Poiares, ao meu pai, apenas porque ambos acreditaram nas virtudes e potencialidades do regionalismo, porque acreditaram que era possível viver de outra maneira; referências que aqui deixo, com a compreensão de todos, porque, entre o muito que aprendi em casa, com os meus pais, a ideia regionalista foi também um grande valor. Diria que a minha irmã e eu fomos socializados sob os auspícios da Casa do Concelho de Góis, deambulando pelo espaço da Rua de Santa Marta - que o Gualter em boa hora encontrara para arrendar -, participando e dormitando nas festas, sob os aromas dos cozinhados da D. Maria, assistindo a largas e prolongadas seroadas na nossa casa, ao Desterro, aonde algumas reuniões terminavam e muitas decisões se planificavam, sob a cumplicidade da nossa mãe, também ela envolvida em plúrimas tarefas regionalistas, ainda que na sombra, como acontecia nos tempos em que ser-se Mulher era uma fatalidade maior que actualmente.
(Palestra proferida na sessão comemorativa do feriado municipal de Góis).
Carlos Alberto Poiares
in A Comarca de Arganil, de 28/01/2009

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1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Pois é:O abenegado trabalho de uns quantos no passado é destruído pelo que se passa agora.Fiquei triste com o que li na imprensa de hoje, melhor dizendo, no Correio da Manhã de 31-1-2009

31 janeiro, 2009 18:15  

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