quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007

Direito ao reconhecimento

Se disser que as colectividades são a alma de muitas terras não estarei muito longe da verdade. Elas preservam a identidade das gentes, das regiões, os usos e costumes, substituem o estado e as autarquias na promoção e desenvolvimento da cultura e do desporto. É nas filarmónicas, nos grupos de folclore, nos coros, no teatro e na imensidão que é o universo das actividades desportivas que se ocupam, por esse país fora, pessoas de todas as idades nas vertentes da formação, competição e lazer. Quantas terras não são conhecidas pela sua banda, pelo seu folclore, pela sua equipa de futebol?
Para manter este fervilhar de actividade, este associativismo a funcionar são precisas pessoas que dirijam. São amadores que se esquecem que têm família, que investem todos os seus tempos livres, que acompanham a actividade diária, as deslocações ao fim de semana, que sofrem com a angústia de querer fazer e não ter meios, que apuram a genialidade na criação de iniciativas para angariar verbas, que vivem e resolvem todos os problemas. São voluntários que se dedicam a manter e a fazer crescer as colectividades, são eles os verdadeiros gestores porque conseguem multiplicar as migalhas que recebem.
O desporto e a cultura não são actividades lucrativas. Precisam de subsídios para existir, mesmo que os utentes paguem de forma simbólica as actividades que lhes são facultadas mas se a exigência é grande, a função social fica comprometida.
Os directores passam o tempo a mendigar subsídios a que deveriam ter direito por prestarem um serviço público. Há autarcas que sentem uma grande contrariedade ao ajudar colectividades mas se algumas só vivem de subsídios a esmagadora maioria promove mil e uma actividades para garantir a sua sustentabilidade.
Ficam assim as colectividades dependentes do bom ou mau humor dos autarcas, da sua sensibilidade, da sua forma de as sentir e encarar, da importância subjectiva que cada um lhes atribui.
Há os que ignoram a sua existência e as necessidades porque se tomassem conhecimento teriam muito dinheiro para distribuir; os que fazem dos subsídios verdadeiras armas de caça ao voto, quando dizem que não há verbas, que o tempo é de contenção mas que não se inibem de subsidiar princepescamente aquelas que têm à frente pessoas da sua confiança política e, por isso, têm de mostrar sucesso, ou para os que querem conquistar para o seu lado. Finalmente os autarcas que definem critérios para uma atribuição justa e equilibrada de subsídios, considerando o número de utentes, a categoria das competições, o plano anual de actividades apresentado, entre outros itens que possam ser importantes estabelecer. Estes sim, aplicam de forma séria e transparente os subsídios esperando como único retorno o bem estar dos seus munícipes.
Cada vez é mais difícil encontrar pessoas que queiram assumir a responsabilidade de tomar conta das colectividades. Sabem o trabalho que têm pela frente, os problemas que levam para casa, a sujeição à arbitrariedade de quem detém o poder e o dinheiro. Já não basta um grande sentido cívico para assumir uma direcção, é necessária uma disponibilidade imensa que só se encontra em quem ama aquilo que faz. Sim, porque a única recompensa para estes homens e mulheres é o reconhecimento do mérito do seu trabalho e o sentir que são úteis ao próximo.
Ana Gouveia
in Diário As Beiras, de 8/02/2007