domingo, 20 de maio de 2007

Presente, de Abílio Bandeira Cardoso

E é este o meu presente
É uma dádiva que recebo e quem nem sempre quero
Para a qual nem sempre me esmero
É uma carta de amor sem destinatário.
Por vezes magoado
Por vezes com os olhos cheios de esperança
É o meu presente
Um presente que embrulho em papel d'oiro
E não o ofereço
Ele terá de ser conquistado
Como coisa valiosa que é!
É feito também de mágoas
De algumas lágrimas que algures me caíram
Provocadas por alguém
Ou por mim próprio
Mas é também feito dos sorrisos que dei em criança
Daquelas gargalhadas puras sem motivo
Sim, essas mesmas que agora conseguimos ouvir...
É feito de esperanças e sonhos
Que ao longo dos anos foram tomando forma
Ou ficaram informes, apenas sonhados...
Este é o meu presente embrulhado em folha d'oiro
É o presente que quero partilhar com alguém
Passando água e sol nas feridas
Beijando as cicatrizes
Secando as lágrimas
Sonhando os sonhos um do outro
Este é o poema do meu presente
O poema que escrevo todos os dias com a caneta da realidade
Com tinta que me circula na alma e nas veias
É vida
Uma vida completa, triste e alegre, serena e revolta
Fácil e difícil, bonita e feia...
Mas é vida!
Sem preocupações de embelezamento
Sem preocupações de julgamento
Sou eu
Apenas igual a mim mesmo
Eu, o verdadeiro.
Eu, o cruel e frio
Eu, o doce dos doces
Eu... Eu, o meu presente...
E como a voz se me embarga quando digo isto
É um presente conquistado todos os dias
Batalhas nuas e cruas
Batalhas internas e externas
Batalhas
Batalhas
Este é o meu presente
Um presente nem sempre fácil
Nem sempre florido
Mas é um presente
E está disponível
A quem o souber receber e respeitar
É um presente presente...

Abílio Bandeira Cardoso

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