Caminhos limpos, caminhada à espera
Encontram-se limpos os caminhos feitos de veredas ascendentes e descendentes que ligavam Ádela e Açor a Cepos e o inverso, assim se re-aproximando três povoações com passado densamente interpenetrado, através da proximidade geográfica, das trocas produtivas, da escola comum, e dos laços familiares e afectivos que o tempo foi urdindo e persistem. Do lado do Colmeal foram limpos há um ano, do lado de Cepos, recentemente. Parabéns às populações e, pela iniciativa, às Juntas de Freguesia de Cepos e Colmeal. Embora já não sirvam objectivos de sobrevivência, os caminhos representam um potencial importante ao serviço do lazer saudável, da preservação do património construído (com que esforço e determinação!), e do combate à desertificação verde que torna o território impenetrável.
Andando por um desses caminhos, podia senti-lo atento às diferenças, e a sorrir contente de se ver limpo e de novo utilizado. Os pés que o pisavam calçavam ténis de marca herdados da moda que passou, o andar da caminhante era vagaroso e desajeitado, frequentemente parado para observar isto ou aquilo. Nada que se parecesse com o andar firme, decidido e apressado dos que antes o trilhavam, com os pés descalços ou mal calçados de tamancas e tamancos que o moíam, moendo as pessoas. E leves! Eram leves os pés que o afagavam, ao contrário dos pesados que antes o calcavam, ora para cima, ora para baixo, transportando, à cabeça ou às costas, as colheitas ribeirinhas, o milho para o moinho, a farinha para a broa, as compras, o saco dos livros e da merenda frugal, o medo do professor no desencontro com os números, as lágrimas vertidas depois umas tantas palmatoadas …
Sentados, à beira de castanheiros velhinhos, de poisos e de currais resistentes ou desmoronados também eles contentes, repousavam finalmente da vida castigada as mulheres e homens que por ali labutavam, como a “Ti” Albertina, o “Ti” António Lourenço ou a “Ti” Emília (Muda). Enquanto as crianças brincavam, com a mãe a apressá-las chamando da colina em frente, o Zairito ladrava e farejava, já esquecido, tantos anos passados, que os coelhos e as perdizes também partiram com as pessoas. “Ó pequena, que cão é esse?”, perguntavam-lhe na rua dos Trigais, nos Cepos, só para a ouvirem responder, ingénua: “É o cão do meu tio!”
Até onde caminhando os caminhos nos podem levar! Agora que estão limpos, vamos percorrê-los de novo, reactivando pertenças, memórias e afectos que são um capital para o futuro? Fica lançado o desafio à sólida experiência da União Progressiva da Freguesia do Colmeal na organização de caminhadas, em articulação as Juntas de Freguesia de Cepos e Colmeal, e com as colectividades de Açor, Ádela e Cepos, todas as outras, e todos, podendo e devendo participar. Por mim, posso fazer de guia e cozinheira pouco dotada de algum petisco tradicional!
Lisete de Matos
Açor, Colmeal, 30 de Novembro de 2007
in A Comarca de Arganil, de 13/12/2007
Andando por um desses caminhos, podia senti-lo atento às diferenças, e a sorrir contente de se ver limpo e de novo utilizado. Os pés que o pisavam calçavam ténis de marca herdados da moda que passou, o andar da caminhante era vagaroso e desajeitado, frequentemente parado para observar isto ou aquilo. Nada que se parecesse com o andar firme, decidido e apressado dos que antes o trilhavam, com os pés descalços ou mal calçados de tamancas e tamancos que o moíam, moendo as pessoas. E leves! Eram leves os pés que o afagavam, ao contrário dos pesados que antes o calcavam, ora para cima, ora para baixo, transportando, à cabeça ou às costas, as colheitas ribeirinhas, o milho para o moinho, a farinha para a broa, as compras, o saco dos livros e da merenda frugal, o medo do professor no desencontro com os números, as lágrimas vertidas depois umas tantas palmatoadas …
Sentados, à beira de castanheiros velhinhos, de poisos e de currais resistentes ou desmoronados também eles contentes, repousavam finalmente da vida castigada as mulheres e homens que por ali labutavam, como a “Ti” Albertina, o “Ti” António Lourenço ou a “Ti” Emília (Muda). Enquanto as crianças brincavam, com a mãe a apressá-las chamando da colina em frente, o Zairito ladrava e farejava, já esquecido, tantos anos passados, que os coelhos e as perdizes também partiram com as pessoas. “Ó pequena, que cão é esse?”, perguntavam-lhe na rua dos Trigais, nos Cepos, só para a ouvirem responder, ingénua: “É o cão do meu tio!”
Até onde caminhando os caminhos nos podem levar! Agora que estão limpos, vamos percorrê-los de novo, reactivando pertenças, memórias e afectos que são um capital para o futuro? Fica lançado o desafio à sólida experiência da União Progressiva da Freguesia do Colmeal na organização de caminhadas, em articulação as Juntas de Freguesia de Cepos e Colmeal, e com as colectividades de Açor, Ádela e Cepos, todas as outras, e todos, podendo e devendo participar. Por mim, posso fazer de guia e cozinheira pouco dotada de algum petisco tradicional!
Lisete de Matos
Açor, Colmeal, 30 de Novembro de 2007
in A Comarca de Arganil, de 13/12/2007
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