Abandono do caminho-de-ferro prejudicou toda a região Centro
A região merece a conclusão do caminho-de-ferro de Arganil. Só assim, garante Manuel Fernandes Dias, se poderá combater a desertificação que ameaça seriamente os concelhos do Interior.
“A história do caminho-de-ferro em Arganil” é o título do livro de Manuel Fernandes Dias que hoje, pelas 18H00, vai ser lançado na Casa Municipal da Cultura, em Coimbra.
Convicto de que o investimento no caminho-de-ferro ajudaria no desenvolvimento do interior da região Centro e do país contribuindo para travar a tão indesejada desertificação, Manuel Fernandes Dias lamenta o “ostracismo a que tem sido votada toda esta região beirã” e aponta o dedo aos políticos do passado distante e aos contemporâneos.
E do alto da experiência dos seus 90 anos, Manuel Fernandes Dias não esconde as razões do seu desapontamento: “É que, enquanto o litoral e as grandes áreas metropolitanas vêem crescer obras de sumptuosidade megalómana, as povoações do Interior, como as desta Beira Serra, de recursos naturais impressionantes para o seu desenvolvimento, continuam a assistir a uma crescente desertificação, pela inexistência de condições para que as suas populações ali continuem a viver. Nesse contexto, consideramos o metropolitano de superfície em Coimbra um exemplo dessa megalomania”.
Defendendo um investimento sério na linha que liga Coimbra à Lousã, o autor garante que “o metropolitano de superfície em Coimbra é impraticável e não se justifica”.
“Coimbra não tem arruamentos, não tem condições, nem tamanho para justificar um metropolitano de superfície”, justifica, adiantando que o dinheiro que se pretende gastar nessa obra megalómana devia servir para completar o projecto de caminho-de-ferro que iria encurtar as distâncias dentro da região e com as outras regiões vizinhas.
Um projecto que, como recorda bem, iria ligar numa primeira fase, Coimbra a Arganil, depois Arganil a Gouveia e mais tarde, com a construção de uma variante a Vendas de Galizes (em Oliveira do Hospital), ligaria toda esta região à Covilhã.
É preciso investir na linha da Lousã
E embora tenham passado muitos anos sobre o início deste projecto, Manuel Fernandes Dias garante que “se o projecto do caminho-de-ferro de Arganil tivesse sido concluído, teria mudado por completo a fisionomia económica e social da importante região no centro do país, mais conhecida por Beiras, e até Coimbra, situada no coração de Portugal, escolhida para cidade-berço de inúmeros reis, teria tido outra projecção para além daquela que deve à sua vetusta universidade”.
E vai mesmo mais longe considerando que “ainda se justifica hoje a sua conclusão, acompanhada do melhoramento de tudo aquilo que foi feito”. Afinal, “a matéria-prima, nomeadamente, os produtos que se destinam à exportação, existem nesta vasta região e precisam de um transporte eficaz que os coloque no mercado nacional e internacional”.
“A região Centro do país compreende um terço da população de Portugal que começou a abandonar os concelhos do Interior para se fixar nos principais centros urbanos”, explica, adiantando que só um investimento significativo no caminho-de-ferro poderia trazer de novo mais população às zonas mais abandonadas.
Confrontado com as explicações da empresas responsáveis que apontam a falta de passageiros como a razão para não investirem mais, Manuel Fernandes Dias reconhece que se trata de um ciclo vicioso.
“As empresas não investem, os passageiros fogem por falta de condições. Os passageiros arranjam outras alternativas... e as empresas não investem”, aponta, adiantando que é possível inverter a situação.
“O movimento seria maior se o comboio se adaptasse às necessidades das populações - aos seus horários, às suas exigências de comodidade - que, hoje em dia, vivem e trabalham, cada vez mais, em terras diferentes”, justificou.
Veja-se, por exemplo, a ligação de Coimbra à Lousã. “O abandono a que foi votada esta linha, bem visível nas silvas que praticamente sobem pelo comboio ao longo da viagem até à Lousã, nas próprias estações que não têm nada para garantir alguma comodidade aos passageiros, é a prova evidente de que a luta das prioridades dos politiqueiros do costume continua a deixar de fora esta vastíssima região e as suas populações”, aponta Manuel Fernandes Dias, lembrando que “chegou a ser feita obra para continuar o caminho-de-ferro até Arganil, mas que o desinteresse demonstrado pelos políticos deitou por terra o projecto”.
E no seu entender, não foram só os concelhos da Beira Serra que sofreram com este desinvestimento. Também o porto da Figueira da Foz, por exemplo, acabou prejudicado.
Promover as potencialidades
Mas Manuel Fernandes Dias não fala por falar. A sua investigação fá-lo tirar conclusões bastante interessantes e actuais. Por exemplo, o investimento no caminho-de-ferro levou ao aumento do número de famílias e de habitantes - entre 1920 e 2001 - nos concelhos da Lousã, Miranda do Corvo, Mangualde, Seia e Oliveira do Hospital. Em, contrapartida, o abandono do projecto fez com que - no mesmo período de tempo - o concelho de Arganil tivesse perdido 103 famílias e 7.075 habitantes; Góis tivesse perdido 1.211 famílias e 7.559 habitantes; Pampilhosa da Serra tivesse perdido 1.170 famílias e 7.972 habitantes. “Para além de ajudar a fixar a população, o caminho-de-ferro é fundamental para promover as potencialidades da região, quer em termos industriais, quer em termos turísticos”, explicou.
Mas não só. Conscicente do peso que as políticas tiveram - e continuam a ter -, Manuel Fernandes Dias admite que Coimbra tem sido prejudicada ao longo dos tempos pelos politiqueiros.
“Quando o projecto do caminho-de-ferro entre Coimbra e Arganil nasceu teve várias hipóteses, duas das quais beneficiavam a margem esquerda, tendo acabado por ganhar a pior que permitiu a construção de uma estação B que foi, e continua a ser, uma vergonha para a cidade e que acabou também por permitir a construção da Estação Nova no centro evitando que se rasgasse uma avenida entre o Choupal e a cidade”, explica, apontando ainda outros projectos que, na sua óptica, acabaram por prejudicar a cidade e a região. A Estrada da Beira que muitos queriam que entrasse na cidade pela margem esquerda, a Alta que Salazar destruiu para construir a universidade, e mais recentemente, o Bota Abaixo e o próprio Estádio de Coimbra que devia ter sido construído numa qualquer freguesia fora daquele centro.
É claro que esta apresentação não é, nem pretende ser, uma análise ao livro de Manuel Fernandes Dias. Essa, diga-se, terá que ser feita lendo a obra bastante actual.
in Diário As Beiras, de 21/03/2007
“A história do caminho-de-ferro em Arganil” é o título do livro de Manuel Fernandes Dias que hoje, pelas 18H00, vai ser lançado na Casa Municipal da Cultura, em Coimbra.
Convicto de que o investimento no caminho-de-ferro ajudaria no desenvolvimento do interior da região Centro e do país contribuindo para travar a tão indesejada desertificação, Manuel Fernandes Dias lamenta o “ostracismo a que tem sido votada toda esta região beirã” e aponta o dedo aos políticos do passado distante e aos contemporâneos.
E do alto da experiência dos seus 90 anos, Manuel Fernandes Dias não esconde as razões do seu desapontamento: “É que, enquanto o litoral e as grandes áreas metropolitanas vêem crescer obras de sumptuosidade megalómana, as povoações do Interior, como as desta Beira Serra, de recursos naturais impressionantes para o seu desenvolvimento, continuam a assistir a uma crescente desertificação, pela inexistência de condições para que as suas populações ali continuem a viver. Nesse contexto, consideramos o metropolitano de superfície em Coimbra um exemplo dessa megalomania”.
Defendendo um investimento sério na linha que liga Coimbra à Lousã, o autor garante que “o metropolitano de superfície em Coimbra é impraticável e não se justifica”.
“Coimbra não tem arruamentos, não tem condições, nem tamanho para justificar um metropolitano de superfície”, justifica, adiantando que o dinheiro que se pretende gastar nessa obra megalómana devia servir para completar o projecto de caminho-de-ferro que iria encurtar as distâncias dentro da região e com as outras regiões vizinhas.
Um projecto que, como recorda bem, iria ligar numa primeira fase, Coimbra a Arganil, depois Arganil a Gouveia e mais tarde, com a construção de uma variante a Vendas de Galizes (em Oliveira do Hospital), ligaria toda esta região à Covilhã.
É preciso investir na linha da Lousã
E embora tenham passado muitos anos sobre o início deste projecto, Manuel Fernandes Dias garante que “se o projecto do caminho-de-ferro de Arganil tivesse sido concluído, teria mudado por completo a fisionomia económica e social da importante região no centro do país, mais conhecida por Beiras, e até Coimbra, situada no coração de Portugal, escolhida para cidade-berço de inúmeros reis, teria tido outra projecção para além daquela que deve à sua vetusta universidade”.
E vai mesmo mais longe considerando que “ainda se justifica hoje a sua conclusão, acompanhada do melhoramento de tudo aquilo que foi feito”. Afinal, “a matéria-prima, nomeadamente, os produtos que se destinam à exportação, existem nesta vasta região e precisam de um transporte eficaz que os coloque no mercado nacional e internacional”.
“A região Centro do país compreende um terço da população de Portugal que começou a abandonar os concelhos do Interior para se fixar nos principais centros urbanos”, explica, adiantando que só um investimento significativo no caminho-de-ferro poderia trazer de novo mais população às zonas mais abandonadas.
Confrontado com as explicações da empresas responsáveis que apontam a falta de passageiros como a razão para não investirem mais, Manuel Fernandes Dias reconhece que se trata de um ciclo vicioso.
“As empresas não investem, os passageiros fogem por falta de condições. Os passageiros arranjam outras alternativas... e as empresas não investem”, aponta, adiantando que é possível inverter a situação.
“O movimento seria maior se o comboio se adaptasse às necessidades das populações - aos seus horários, às suas exigências de comodidade - que, hoje em dia, vivem e trabalham, cada vez mais, em terras diferentes”, justificou.
Veja-se, por exemplo, a ligação de Coimbra à Lousã. “O abandono a que foi votada esta linha, bem visível nas silvas que praticamente sobem pelo comboio ao longo da viagem até à Lousã, nas próprias estações que não têm nada para garantir alguma comodidade aos passageiros, é a prova evidente de que a luta das prioridades dos politiqueiros do costume continua a deixar de fora esta vastíssima região e as suas populações”, aponta Manuel Fernandes Dias, lembrando que “chegou a ser feita obra para continuar o caminho-de-ferro até Arganil, mas que o desinteresse demonstrado pelos políticos deitou por terra o projecto”.
E no seu entender, não foram só os concelhos da Beira Serra que sofreram com este desinvestimento. Também o porto da Figueira da Foz, por exemplo, acabou prejudicado.
Promover as potencialidades
Mas Manuel Fernandes Dias não fala por falar. A sua investigação fá-lo tirar conclusões bastante interessantes e actuais. Por exemplo, o investimento no caminho-de-ferro levou ao aumento do número de famílias e de habitantes - entre 1920 e 2001 - nos concelhos da Lousã, Miranda do Corvo, Mangualde, Seia e Oliveira do Hospital. Em, contrapartida, o abandono do projecto fez com que - no mesmo período de tempo - o concelho de Arganil tivesse perdido 103 famílias e 7.075 habitantes; Góis tivesse perdido 1.211 famílias e 7.559 habitantes; Pampilhosa da Serra tivesse perdido 1.170 famílias e 7.972 habitantes. “Para além de ajudar a fixar a população, o caminho-de-ferro é fundamental para promover as potencialidades da região, quer em termos industriais, quer em termos turísticos”, explicou.
Mas não só. Conscicente do peso que as políticas tiveram - e continuam a ter -, Manuel Fernandes Dias admite que Coimbra tem sido prejudicada ao longo dos tempos pelos politiqueiros.
“Quando o projecto do caminho-de-ferro entre Coimbra e Arganil nasceu teve várias hipóteses, duas das quais beneficiavam a margem esquerda, tendo acabado por ganhar a pior que permitiu a construção de uma estação B que foi, e continua a ser, uma vergonha para a cidade e que acabou também por permitir a construção da Estação Nova no centro evitando que se rasgasse uma avenida entre o Choupal e a cidade”, explica, apontando ainda outros projectos que, na sua óptica, acabaram por prejudicar a cidade e a região. A Estrada da Beira que muitos queriam que entrasse na cidade pela margem esquerda, a Alta que Salazar destruiu para construir a universidade, e mais recentemente, o Bota Abaixo e o próprio Estádio de Coimbra que devia ter sido construído numa qualquer freguesia fora daquele centro.
É claro que esta apresentação não é, nem pretende ser, uma análise ao livro de Manuel Fernandes Dias. Essa, diga-se, terá que ser feita lendo a obra bastante actual.
in Diário As Beiras, de 21/03/2007
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