terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

Os contornos da pobreza

A clássica e antiga estratificação da sociedade em geral, era vulgarmente apresentada como baixa, média e alta o que permitia um fácil enquadramento de qualquer cidadão. Hoje, porém, essa ordem simplificada já não corresponde a uma realidade cada vez mais complexa e diversificada, já que as actuais e diferentes condições sociais exigem um maior e rigoroso apuro na classificação. Isto se não quisermos meter tudo no mesmo saco, o que não ajudaria muito.
Assim, temos uma classe social alta onde se podem incluir os ricos, os muito ricos e os poderosos, cada qual com o seu tique. No outro estremo temos a classe social baixa que pode subdividir-se em pobres, muito pobres e os desgraçados (os sem abrigo). Todos os que sobram destes naipes, infelizmente já muito diminutos, fazem parte da já magra classe média, que por sua vez poderá ser repartida em média baixa e média alta. Seria um bom indicador que ela ocupasse um maior espaço na pirâmide da sociedade, mas adiante...
Donde emerge a ideia de que hoje, a pobreza como condição social que a todos deve preocupar, não pode ser medida apenas pelo escasso poder de compra de bens de primeira necessidade. Há outros sinais, por vezes encobertos (a dependência, a violência doméstica, a deficiente alimentação, etc.) que complementam e ajudam a definir com mais rigor, o grau de pobreza de que se está a falar, para que tudo fique no seu devido lugar. Ponto crucial onde queríamos chegar.
Por vezes, uma família já estruturada com um baixo salário, com um tecto próprio preenchido de condições essenciais num meio rural, pode não ser considerada muito pobre; mas se essa mesma família não tiver em casa electricidade, não tiver água canalizada, nem condições sanitárias satisfatórias, então a sua classificação tem de ser outra, pela simples razão de que ela já não pode ter acesso aos bens básicos da condição humana duma sociedade dita evoluída, como sejam os lúdicos, a informação, nem tampouco os culturais. O que nos mostra bem os indicadores mais importantes.
Na sociedade de comunicação/informação, esta família tem, à partida, barrado o acesso aos bens de consumo correntes e necessários, o que coloca numa situação de carência, para não dizer apenas de desigualdade, com a agravante que isto pode acontecer a cidadãos que cumprem as suas obrigações de cidadania.
Desta situação extrema se podem levantar várias questões, mas há uma que é gritante: para que serve pensar em computador como ferramenta do saber para os jovens desenvolverem as suas capacidades se o seu hipotético lar não tem electricidade? E se assim é, poder-se-á perguntar se não estarão eles em grande desvantagens em relação aos seus colegas?
Assim sendo, ficamos a pensar que, para construirmos uma sociedade justa e solidária que tanto ambicionamos, ainda temos um longo caminho a percorrer.
É claro que, estas mal alinhavadas palavras, representam apenas preocupações dum cidadão atento e inquieto, não passam duma mera opinião pessoal que se pode estender aos leitores menos informados. Não são por isso recado para minguém, nem têm um código postal, pelo que qualquer remoque que por aí possa vir, torna-se completamente tranquilo.
Adriano Pacheco
in Jornal de Arganil, de 8/02/2007