domingo, 9 de novembro de 2008

Os Caminhos da Desertificação

Longe vão os tempos em que a vida na aldeia era vivida em comunidade de forma muito intensa, quer no contacto do dia-a-dia, quer na comunhão e convivência no seio de gerações onde qualquer pretexto servia para a ocupação dos poucos tempos livres. Verdade seja dita que nem todas as actividades estavam talhadas para o desenvolvimento cultural, forma apropriada ao crescimento harmonioso do ser humano, mas apenas se direccionavam para a diversão lúdica, bálsamo desejado ao alívio do cansaço físico.
Actualmente e tendo em conta a distância que o tempo nos separa da fase da nossa adolescência, observamos com alguma inquietação que, de várias famílias numerosas então existentes, compostas por seis ou sete filhos, apenas um ou dois membros dessas famílias mantêm ligação assídua com o seu torrão natal, o que deixa um enorme vazio no clã que antes era formado por um lar de grandes dimensões, onde a alegria marcava a sua presença.
Face a este problema salta-nos a seguinte questão: onde estão os restantes membros dessas famílias? Por onde se quedam sem darem sinal?
Para esta estranha e fria ausência que o devir dos tempos nos trouxe como castigo, contribuíram a falta de várias condições de desenvolvimento que esta pobre região não podia oferecer, deixando assim fugir a força de muitos braços de trabalho, cuja falta hoje bem se faz sentir. Mas como se pode julgar a escolha fez a sua vida, se a própria aldeia ou região apenas lhe podia proporcionar trabalho rude, violento e mal humorado? Numa época em que noutros pontos do país a oferta do mercado de trabalho era bastante mais aliciante, com a possibilidade dos filhos poderem aumentar os seus conhecimentos!
Aperta-se-nos a alma ao encararmos o estado desolador de despovoamento em que esta região se encontra - situação que faz jus à tendência verificada no interior do país que nos coloca perante a soberba mancha de pinhal disseminado nestas vastas serranias cheias de potencialidades, mas quase despovoadas. Por outro lado, quem é que tem moral para apontar o dedo àqueles que não tiveram alternativa à escolha que fizeram, numa fase em que a migração era o convite mais aliciante para uma vida melhor e nada nem ninguém olhava para o interior do país?
Hoje facilmente se encontram teóricos na imprensa a esmiuçar os erros das opções tomadas por cada um, com os prós e os contras ali à flor da pele, como duma profecia se tratasse. Ideia que não pode ir além duma opinião vazia de conteúdo de quem nunca sentiu o sabor amargo duma gota de suor, ou do arfar arquejante na escalada dos montes aquando da recolha da resina, quando mais nenhuma saída se perfilava no horizonte para uma vida menos penosa. É sempre fácil debitar palpites para quem não conheceu, por dentro, a revolta daqueles que sentiram os caminhos vedados, o muro intransponível do obscurantismo, ou o sabor amargo duma lágrima debulhada pelo destino.
Analisar a origem e o percurso que levou esta região à sua desertificação, em todos os seus contornos, ou criticar a atitude de quem calcorreou os seus caminhos, é um tema recorrente e de fácil abordagem; difícil se torna fazê-lo de forma consciente e com conhecimento de causa! Para se avaliar, de forma correcta, as várias motivações desta gente que esteve no cerne da questão, torna-se necessário conhecer as dificuldades que o desenraizamento acarreta e o sofrimento de ter de deixar os haveres e os seus familiares em idade já avançada.
Ninguém sai da sua terra com um sorriso nos lábios, mas sim com o coração despedaçado, isso apenas o saberá quem já passou por esta situação e agora olha para trás e conclui que não havia outra alternativa.
Adriano Pacheco
in O Varzeense, de 30/10/2008

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4 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Bem...tempos houve em que o sorriso era certamente de orelha a orelha, ou não?

10 novembro, 2008 02:05  
Anonymous Anónimo said...

Nunca percebi muito bem o que pretende este homem com os seus escritos. E também não é desta...

10 novembro, 2008 09:05  
Anonymous Anónimo said...

O senhor diz que nao percebe mas o certo é que reconhece o autor. O que quero dizer é que certamente a houve muita gente antigamente, refiro-me à geraçao do pós 25 de abril, que bem contente ficou de sair da sua terra para alcançar melhores condições de vida. O que acha o meu caro anónimo?

gostaria também de dar os parabéns ao autor deste blog. Bem-haja por tão bem saber divulgar estas terras

13 novembro, 2008 23:24  
Anonymous Anónimo said...

Qual o outro o tal Tigo, desculpem Doutor Tigo, falou em desertificação, saltou-lhe tudo em cima e a agora o t. alegre do Adriano Pacheco fala nisso é esta tudo de acordo?
Eu gosto mto deste senhor e dos artigos que ele escreve sobre ele proprio!

28 novembro, 2008 15:03  

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