terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Gente da Serra - Modos de Vida Entre a Cidade e a Aldeia

Acabei há tempos a leitura atenta de sua tese de doutoramento, em Sociologia, da Dr.ª Lisete de Matos, nossa conterrânea do Açor, Colmeal.
Como não tenho capacidade para avaliar este trabalho vou dar as impressões que tirei da leitura e que tanta alegria me deu.
Está de parabéns a freguesia do Colmeal pois este estudo ficará a assinalar, para a posteridade, o modo de vida das humildes gentes da freguesia e das freguesias vizinhas.
As entrevistas feitas, a 24 colmealenses, mostram bem a vontade de ser alguém, e quanto isso lhe custou em esforço físico, com suor, frugalidade, inteligência e renúncia.
Venceram sós ou com o apoio de familiares ou conterrâneos e apoiados nas saudades nunca esqueceram a terra, apesar das agruras ali vividas.
Suas vidas dão 24 capítulos de um livro, que por certo vai completar a "Gente da Serra e seu quotidiano", cujo exemplar, me foi surripiado no dia do Magusto, dia 17 de Novembro, na Casa do Concelho de Góis, depois de alguns anos na mesa de cabeceira.
Preocupei-me em descobrir quem vestia as personagens entrevistadas e uma só, o Júlio, se denunciou integralmente, e alguns outros deixaram detalhes denunciadores.
A vida dos colmealenses é semelhante há de muitos outros serranos, das terras vizinhas, mas achamos que cada pessoa tem a sua vida própria e portanto a sua história, mas Lisete de Matos, para a sua tese, soube ouvir os desabafos de gente atribulada e es- forçada, que venceu, mas não esquece as agruras da vida que levava nas suas aldeias mas que de modo diferente teve de ultrapassar na cidade.
Apesar dos trabalhos eda vida rude levada nas aldeias nunca esqueceram a sua terra e através da sua União tudo fizeram para a desenvolver.
São essas histórias, que não estão na tese, mas na lembrança da entrevistadora, que por certo vão dar mais realismo, a um outro livro, que por certo irá surgir.
As razões de relutância de regressar às origens justificam-se, como salienta, pelos mesmo motivos que estiveram na origem da sua saída: a falta de condições, cada vez mais salientes.
As nossas terras estão a ser vitimas de políticas erradas para as aldeias e gentes do interior e a quase nula ou baixa natalidade encaminham as povoações, a curto prazo, para a desertificação total, e hoje já pouco se poderá fazer para o evitar.
Ser terras de férias e lazer seria um ideal para os filhos ou netos daqueles que dali saíram há mais de 60 anos, mas as outras gerações procurarão outras condições pois até familiares já poucos ali residem. E as casas, para ir de férias, ficam de dispendiosa manutenção, e é arriscado, pois ficam sujeitas ao roubos e vandalismos além de obrigar as famílias a fazer compras longe, cozinhar, arrumar a casa, lavar roupas, anulando o repouso e a tranquilidade que se requer nas férias.
Por vezes surgem oportunidades inesperadas das terras acordarem, ganharem vida nova e até pode acontecer que a pastorícia, o fabrico de queijos, já assinalável, o aproveitamento do rio Ceira, com a pesca ou uma estrutura, ambiciosa, que adapte as casas a poderem ser ocupadas vários dias, durante todo o ano, se os proprietários a isso se dispuserem, por quem procure só sossego e bons ares.
Mas para isso há que mudar mentalidades, despertar ambição e deixar à nossa gente a sua resolução.
Enquanto isso, há que agradecer a Lisete de Matos por ter deixado um estudo profundo das nossas gentes, do Colmeal, e das suas condições de vida e o prazer que senti por ter saboreado as histórias desses heróicos goienses.
Matos Cruz, 2 de Fevereiro de 2007
in O Varzeeense, de 15/02/2008

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