quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Alvares - Devoção a S. Sebastião

Uma comissão organizadora, este ano constituída pelos elementos da Associação de Jovens da freguesia de Alvares, concelho de Góis, com o apoio da Junta de Freguesia local, levou a efeito ao longo do passado fim-de-semana, dias 19 e 20 de Janeiro, como é habitual todos os anos, a tradicional festa de S. Sebastião.
Uma festa muito peculiar que é conhecida pela oferta do bodo, um pão que é benzido junto à capela pelo pároco da freguesia e que, posteriormente, é oferecido à população.
Segundo o padre Ramiro Moreira, este ritual realiza-se desde o século XVI e surgiu de uma promessa feita pelos populares a S. Sebastião para que curasse as pessoas de uma epidemia que na altura fustigou o país.
Inicialmente o pão era oferecido aos mais pobres, juntamente com os tremoços, no entanto, esta festa foi ganhando outros contornos e, actualmente, para além do pão e dos tremoços, oferece-se a sardinha, a carne e o vinho a todos quantos compareçam na festa. De acordo com os populares, embora a tradição já "não seja o que era", em virtude também da desertificação das zonas do interior, as pessoas ainda participam neste evento e são sobretudo aqueles que residem em Lisboa, mas com raízes na terra, que guardam este fim-de-semana para rumar à Beira Serra.
A festa começou no sábado, com o tradicional baile na Casa de Convívio, a cargo de um duo musical, prolongando-se no domingo com a missa logo de manhã, seguida da procissão e a bênção e distribuição do bodo. Segundo Luisa Baeta, presidente de direcção da Associação Juvenil de Alvares, que contou com a colaboração na organização da festa dos colegas de direcção, Pedro Leal, Paula Trindade e Joaquim Mateus, esta iniciativa "correu bastante bem", não só pela grande comparência das pessoas, mas também pela sua contribuição.
Em declarações à A Comarca de Arganil, Luísa Baeta explicou que para realizar esta festa eram necessários inicialmente cerca de 600 euros para pagar ao agrupamento musical e para comprar a carne de porco para as refeições, quantia que em parte foi obtida através de um peditório feito na aldeia e de um leilão. No entanto, "este ano a Junta ofereceu o pão e os tremoços, o que ainda é à volta de 200 euros", acrescentou, congratulando-se com o balanço efectuado no final desta iniciativa.
Estabelecendo uma comparação com há alguns anos atrás, a dirigente da Associação Juvenil contou que "há uns anos via-se muita gente da freguesia, todas as pessoas sabiam que neste dia era o bodo", hoje em dia, "as pessoas vêm da freguesia, mas vêm sobretudo de Lisboa". "Desde miúda que já tínhamos esta rotina", afirmou, embora realçando que antigamente "não era com tanta carne, era só broa e os tremoços, e depois começou a haver sardinha". Segundo Luísa Baeta, hoje em dia já há "um pouco de tudo", sendo que as próprias pessoas que se deslocam até à festa se encarregam de levar o vinho.
Relativamente à Associação Juvenil da Freguesia de Alvares, a presidente de direcção revelou à A Comarca de Arganil que quando surgiu as iniciativas que organizava eram sobretudo bailes na terra, no entanto, tendo em conta que agora os jovens têm outros interesses, a Associação dedica-se à organização de eventos desportivos, tais como torneios de futebol e paintball, proporcionando também algumas visitas aos habitantes de Alvares, tendo sido a última ao Jardim Zoológico, já que "acabamos por estar longe de tudo". Enaltecendo que as actividades que promovem adequam-se também aos mais idosos, Luísa Baeta explicou que "os primeiros sócios que tivemos foram pessoas mais idosas", neste caso, os avós e pais dos elementos que formaram o grupo há 14 anos. "Não temos assim tanta juventude, temos muita população idosa, por isso tentamos juntar os dois grupos etários", reforçou, referindo que actualmente a Associação conta com cerca de 120 sócios, sendo "uma das mais antigas do concelho de Góis".
Também o presidente da Junta de Freguesia de Alvares confirmou à A Comarca de Arganil que a Festa de S. Sebastião é uma tradição "desde há muito tempo" que se vai cumprindo todos os anos. Apesar de ser feita com o mesmo objectivo de antigamente, o bodo hoje "é quase um almoço comunitário", disse Vítor Duarte, alegando que esta iniciativa constitui "um factor de coesão das pessoas que se afastaram da terra ou da freguesia". "Mais de 50 por cento das pessoas que estão aqui não residem na freguesia e vêm mostrar o seu amor e carinho pela tradição e pela sua terra", declarou, enaltecendo que, apesar de no Verão se realizar uma festa em honra do padroeiro S. Mateus, esta é a dita "festa de Alvares", já que "S. Sebastião é um santo que acarinhamos muito".
Questionado pela A Comarca de Arganil acerca da história inerente a esta festa, o presidente da Junta recordou que "S. Sebastião era um romano que foi convertido para a religião católica" e que sempre esteve associado "às guerras e às tragédias". "Posteriormente a comunidade de Alvares foi vítima de graves epidemias que afectaram toda a população e daí o povo passou a devotar a sua cura a S. Sebastião", contou, acrescentando que este santo é visto como o "defensor dos desprotegidos". Desta forma, todos os anos, o pároco da freguesia nomeia uma comissão, que integra duas pessoas da aldeia e uma de Lisboa, e com o apoio da Junta de Freguesia, no que respeita à manutenção do espaço e compra do pão e tremoços, realiza-se esta festa porque "é uma tradição mesmo genuína".
Lurdes Gonçalves
in A Comarca de Arganil, de 24/01/2008

Etiquetas: