quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Entrevista com Padre António Calixto (excerto)

Começou a sua actividade sacerdotal nas paróquias de Serpins, Casal de Ermio e Foz do Arouce em Outubro de 1994. Depois, em Janeiro de 1995 veio para Vila Nova do Ceira. Nessa altura ainda residia em Serpins, onde esteve nove anos e era simultaneamente o assistente regional dos escuteiros.
Em 2000 deixou a assistência dos escuteiros e ficou com as paróquias, devido a problemas de saúde. Posteriormente foram-lhe reduzidas as paróquias e ficou só com duas e em 2003 passou a paroquiar Pombeiro da Beira e Vila Nova do Ceira, onde se mantém.
O padre António Calixto participou na Assembleia Geral da Conferência dos Países Ibero-Americanos, onde recebeu um prémio para a Escola Profissional da Lousã, da qual é o director, e o grau de "doutor honoris causa" pela New York City University. A Escola recebeu o prémio "Excelência na Educação" pelos métodos e resultados e o responsável pelos resultados alcançados recebeu o grau de "doutor honoris causa" na área da Pedagogia e Administração.
Em entrevista à Comarca de Arganil, o padre António Calixto falou (...) com a simplicidade e boa disposição que lhe é característica.
(...)
A Comarca - Sei que recebeu o grau de doutor "honoris causa" na área da Pedagogia e Administração e também tirou o mestrado em Gestão e Administração. Como é que associa isto à sua vida paroquial?

A.C.- O mestrado em Gestão e Administração Escolar e o doutoramento "honoris causa" em filosofia da educação foi por reconhecimento do trabalho desenvolvido a outro nível que não as paróquias.

A Comarca - Tal como disse, podemos considerar que por vezes o reconhecimento vem de onde menos se espera?

A.C.- Isso tem a ver com o eu ser padre e também tem a ver com o trabalho específico da escola em que estou e em que sou director. Quando me referi a isso, referia-me a que muitas vezes estamos à espera de o nosso trabalho ser reconhecido a um determinado nível, ou por um determinado grupo, ou por determinadas instituições ou instâncias que trabalham a par e passo connosco e muitas vezes o que acontece não é isso. De facto, não estava à espera que fosse uma entidade internacional que eu na altura desconhecia, que estivesse atenta aquilo que se passava num sítio longínquo como a Lousã para ir distinguir a Escola Profissional por mérito e por excelência educativa e de reconhecer que essa mudança que houve ao nível da Escola foi motivada pelo trabalho dinamizado pela minha pessoa. Foi nesse sentido que eu fiz essa afirmação. De facto, nunca esperava que o reconhecimento viesse desse lado tão longe, da Conferência Ibero-Americana para a excelência educativa, pois nem sequer sabia que existia, só depois tomei conhecimento que tinha sido atribuído o prémio e que nós tínhamos estado sobre avaliação já há algum tempo e que redundou na atribuição desse prémio à Escola.

A Comarca - É também o director do jornal "O Varzeense". Será que podemos dizer que é o homem dos sete ofícios?

A.C.- Já fui mais... Não gosto de estar parado e não ter objectivos. Para prosseguir tento ir sempre um bocadinho mais longe do que aquilo que fui antes. Não tenho sete ofícios, são só três ou quatro, às vezes são um bocadinho distintos. É um bocadinho difícil de conciliar, mas vai-se conseguindo estar nuns lados e nos outros e pode sempre fazer com que o trabalho vá avançando. Eu nunca trabalho sozinho, em qualquer dos trabalhos eu não estou sozinho, é sempre uma equipa que trabalha comigo, ou sou eu que trabalho com uma equipa. O mérito, se é que tenho, estará na escolha da equipa e das pessoas que pertencem à equipa e não propriamente ao meu trabalho em si, porque não há pessoas insubstituíveis e por isso qualquer pessoa pode vir fazer o trabalho que estou a fazer. Depois começa de facto pela atribuição das tarefas, pela responsabilização das pessoas, é um pouco o modo como tento desenvolver o trabalho, e por isso não sou o homem dos sete ofícios, repito.

A Comarca - Na sua opinião, como é que os jovens vêm a Igreja nos dias de hoje?

A.C.- Da mesma forma que as outras pessoas, tudo depende da forma que lhes é apresentada e como lhes é proposto aquilo que a Igreja tem para propor. E não podemos perder de vista que se antes a Igreja era a única instância/instituição, que tinha algum tipo de actividades um pouco diferentes ou que talvez ocupassem os tempos livres das pessoas, hoje há um sem número de atractivos e a outros níveis e por isso a Igreja tem de ir também ao encontro, tem de se aproximar não é só dos jovens mas de todas as pessoas, tem de se aproximar de uma forma cativante e por isso tem que fazer um esforço constante por adaptação, mudança e alteração. E isso não acontece apresentando-se sempre da mesma forma. Por isso a Igreja tem que ir vestindo a roupagem dos tempos que vão passando e do tempo em que está inserida. Não separo os jovens do resto, é um questão de a Igreja lhes fazer uma proposta que eles considerem atractiva e não há problema em relação aos jovens virem, estarem e aderirem, o que há é que encontrar novas formas de propor a quem hoje tem mil e uma situações, de lhes propor a mensagem do Evangelho de uma forma que para eles seja atractiva e cativante e que os continue a trazer ou pelo menos não os deixar perder ou fugir.

A Comarca - O que considera que é preciso mudar na Igreja para melhorar?

A.C.- Sobretudo essa mudança e abertura de mentalidades. As pessoas não podem estar à espera que seja o mesmo esquema de sempre, uma Igreja clerical e dependente do padre. As pessoas têm que tomar um bocado mais de consciência que a Igreja não é só o padre, mas somos todos os baptizados e que o padre está na Igreja como coordenador da acção, das actividades, como representante do exercício ministerial, na pessoa do próprio Jesus Cristo. Mas a Igreja em si para avançar e para caminhar, não tem necessariamente de estar dependente e na expectativa de que o padre é que seja o primeiro a fazer e o primeiro a avançar e ter as ideias todas e só as ideias dele é que valem, isso é absolutamente errado. Por isso é que eu dizia tem que haver uma mudança radical de mentalidades. Hoje não pode de modo algum uma Igreja viver dessa forma, que o padre leve a reboque, tem que ser um trabalho de equipa, um trabalho de comunhão, de comunidade e é esse o salto, que é necessário ainda hoje fazer na esmagadora maioria das comunidades, deixando de ser a comunidade cristã centrada no padre para passar a comunidade cristã centrada na comunidade enquanto tal. Aqui é sinal e testemunho de Jesus Cristo e não é o padre, que é uma pessoa como outra qualquer, um homem como os outros e por isso com falhas e com dificuldades e com tudo o resto. Mas se olharmos para a Igreja sem ser eclesiástica, isso é centrada na pessoa do padre ou de quem quer que seja, mas dedicada à hierarquia eclesiástica e olharmos para a Igreja como comunhão de pessoas, comunhão de carismas, em que cada um tem lugar a desempenhar aquilo que melhor sabe fazer, é essa a mentalidade que há a mudar. E é muito mais difícil mudar as mentalidades do que mudar tudo o resto, pois pode mudar-se uma casa num dia ou dois, ou até numas horas, agora as mentalidades das pessoas são um bocadinho mais difíceis de mudar. Como dizem as opiniões dos técnicos abalizados, a mentalidade de uma comunidade para mudar demora pelo menos uma geração, por isso é muito trabalho que se vai fazendo e que nunca está terminado, porque quando se muda a mentalidade aquela que se adquiriu já não é desse tempo e mal se acabou na transição já se está em transição para outra. Isso é um trabalho continuado e esse é o que é capaz de dificultar um bocado mais a tarefa e missão do próprio padre. É essa mudança, porque os tempos mudam e hoje com todos os meios que as novas tecnologias colocam ao nosso dispor, tudo isso tem que ser trazido e aproveitado, tem que ser envolvido para que a mensagem do Evangelho continue a ser anunciada e a passar.
Susana Duarte
in A Comarca de Arganil, de 29/01/2008

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