Carta aberta de João Nogueira Ramos ao Movimento Cidadãos por Góis
Senhor Presidente do Movimento,
Apreciei e aprovo por inteiro o editorial de hoje do nosso Portal. Eu próprio fiz, na semana passada, quando estive em Góis, uma sondagem informal junto dos seus habitantes (pequena, mas mesmo assim, talvez três dezenas de pessoas) e pude constatar o desagrado geral. Mais que a revolta de alguns, senti em todos eles uma enorme tristeza e amargura. Porque não se trata apenas da inestética e do mau gosto, está-se em presença de lapidação de mais um pedaço importante do nosso património histórico.
Permita-me, no entanto, abordar a questão um pouco mais além.
Como se sabe, a vila de Góis não tem (que seja do conhecimento público) um projecto global do seu desenvolvimento. Cada Presidente de Câmara, logo que ocupa a cadeira do poder, comporta-se como rei absoluto e manda executar os projectos que mais lhe agrada e sempre com medidas avulsas. E o que se lhes tem visto ultimamente, é a obsessão de dotar a vila de um cariz moderno, desprezando a parte histórica. Parece querer-se torná-la igual a tantas outras vilas que há pelo país fora, tirando-lhe a sua própria identidade, o que lhe dá a sua própria personalidade e que, eventualmente, poderia torná-la atractiva ou colocá-la no mercado turístico.
Um cobre as calçadas de alcatrão. Outro deita abaixo (sem motivo aparente) a Casa das Ferreirinhas. Um outro dá um piparote no ex-Largo de Pombal (agora rebaptizado por Eira), que tanto diz a todos nós, quer do ponto de vista histórico quer arquitectónico. Ou então inicia obras para um museu, para logo de seguida se arrepender e abandoná-lo. E, sobretudo, todos eles sem medidas de conservação e de valorização daquilo que conforma o Centro Histórico.
Todos sentimos que Góis está a perder, quiçá de uma maneira irreversível, a sua alma e o seu encanto históricos. Se é que já não os perdeu.
Ainda não há muito tempo, a escola que eu frequento, em Lisboa, organizou um passeio para conhecer algumas aldeias históricas da Beira Alta. Sabendo-se da minha naturalidade, insistiram que também se passasse por Góis, pois alguns deles, com profundos conhecimentos de História, tinham curiosidade de a conhecer sobre esse aspecto. Mas, sabendo eu dos locais que depois íamos visitar, tive a consciência do mau serviço que iria prestar à minha terra, sujeitando-a a uma comparação desvantajosa, e dando a conhecer o que não deve ser conhecido por pessoas entendidas. Arranjando uma desculpa, decidi encaminhar a camioneta (éramos meia centena no total) para o Castelo e mostrar-lhes Góis lá de cima… ao longe. E dali rumámos, para almoçar num restaurante típico em Coja, visitar o Piodão e deleitar-nos, pela noite dentro, por ruelas de uma aldeia antiga, essas sim, de passeio agradável. Confesso que sentia um pouco de vergonha em mostrar a minha própria terra àquele núcleo especial de visitantes e meus companheiros…
Não falo do Posto de Turismo encerrado, da falta de informações históricas ou da ausência de indicações na via pública, de que tantos se lamentam quando aqui vêm. É muito mais que isso, é o ar de abandono, de desleixo, que se respira.
Curiosamente, em 2001, a Câmara Municipal pediu para ser incluída na Associação Portuguesa dos Municípios com Centro Histórico, “um passo imprescindível não só para preservar como dinamizar o centro histórico”, segundo palavras do nosso Presidente da Câmara…
Mas não seria mais vantajoso Góis assumir de vez deixar de o ser, em vez de andar a ludibriar? Será positivo continuar-se a deixar passar para o exterior a ideia de que Góis tem um Centro Histórico? Ou, pelo contrário, ao dar a conhecê-lo aos outros, não estamos a prejudicar a nossa terra, dando uma imagem negativa? Não será melhor esquecermo-lo de vez, guardá-lo a sete chaves, como uma relíquia antiga, e não despendendo dinheiros inutilmente (tal como os valioso tesouros doados ao concelho e guardados há talvez mais de duas dezenas de anos, sem ninguém poder pôr a vista em cima)?
Senhor Presidente do Movimento. Não será possível pôr em marcha um movimento (e fazendo jus ao nome da nossa Associação…) para repensar o que se pretende com o futuro da vila de Góis? Isto é, pôr os goienses pensantes a discutir o estabelecimento de um projecto em que seja claramente traçado o seu rumo e que comprometa a comunidade. Os goienses ficar-lhe-iam agradecidos.
Claro que propor é muito fácil. Mas realizar o quase impossível, como bem sabe, dá um enorme prazer.
Lisboa, 12 de Novembro de 2007
João Barreto Nogueira Ramos
in www.portaldomovimento.com
Apreciei e aprovo por inteiro o editorial de hoje do nosso Portal. Eu próprio fiz, na semana passada, quando estive em Góis, uma sondagem informal junto dos seus habitantes (pequena, mas mesmo assim, talvez três dezenas de pessoas) e pude constatar o desagrado geral. Mais que a revolta de alguns, senti em todos eles uma enorme tristeza e amargura. Porque não se trata apenas da inestética e do mau gosto, está-se em presença de lapidação de mais um pedaço importante do nosso património histórico.
Permita-me, no entanto, abordar a questão um pouco mais além.
Como se sabe, a vila de Góis não tem (que seja do conhecimento público) um projecto global do seu desenvolvimento. Cada Presidente de Câmara, logo que ocupa a cadeira do poder, comporta-se como rei absoluto e manda executar os projectos que mais lhe agrada e sempre com medidas avulsas. E o que se lhes tem visto ultimamente, é a obsessão de dotar a vila de um cariz moderno, desprezando a parte histórica. Parece querer-se torná-la igual a tantas outras vilas que há pelo país fora, tirando-lhe a sua própria identidade, o que lhe dá a sua própria personalidade e que, eventualmente, poderia torná-la atractiva ou colocá-la no mercado turístico.
Um cobre as calçadas de alcatrão. Outro deita abaixo (sem motivo aparente) a Casa das Ferreirinhas. Um outro dá um piparote no ex-Largo de Pombal (agora rebaptizado por Eira), que tanto diz a todos nós, quer do ponto de vista histórico quer arquitectónico. Ou então inicia obras para um museu, para logo de seguida se arrepender e abandoná-lo. E, sobretudo, todos eles sem medidas de conservação e de valorização daquilo que conforma o Centro Histórico.
Todos sentimos que Góis está a perder, quiçá de uma maneira irreversível, a sua alma e o seu encanto históricos. Se é que já não os perdeu.
Ainda não há muito tempo, a escola que eu frequento, em Lisboa, organizou um passeio para conhecer algumas aldeias históricas da Beira Alta. Sabendo-se da minha naturalidade, insistiram que também se passasse por Góis, pois alguns deles, com profundos conhecimentos de História, tinham curiosidade de a conhecer sobre esse aspecto. Mas, sabendo eu dos locais que depois íamos visitar, tive a consciência do mau serviço que iria prestar à minha terra, sujeitando-a a uma comparação desvantajosa, e dando a conhecer o que não deve ser conhecido por pessoas entendidas. Arranjando uma desculpa, decidi encaminhar a camioneta (éramos meia centena no total) para o Castelo e mostrar-lhes Góis lá de cima… ao longe. E dali rumámos, para almoçar num restaurante típico em Coja, visitar o Piodão e deleitar-nos, pela noite dentro, por ruelas de uma aldeia antiga, essas sim, de passeio agradável. Confesso que sentia um pouco de vergonha em mostrar a minha própria terra àquele núcleo especial de visitantes e meus companheiros…
Não falo do Posto de Turismo encerrado, da falta de informações históricas ou da ausência de indicações na via pública, de que tantos se lamentam quando aqui vêm. É muito mais que isso, é o ar de abandono, de desleixo, que se respira.
Curiosamente, em 2001, a Câmara Municipal pediu para ser incluída na Associação Portuguesa dos Municípios com Centro Histórico, “um passo imprescindível não só para preservar como dinamizar o centro histórico”, segundo palavras do nosso Presidente da Câmara…
Mas não seria mais vantajoso Góis assumir de vez deixar de o ser, em vez de andar a ludibriar? Será positivo continuar-se a deixar passar para o exterior a ideia de que Góis tem um Centro Histórico? Ou, pelo contrário, ao dar a conhecê-lo aos outros, não estamos a prejudicar a nossa terra, dando uma imagem negativa? Não será melhor esquecermo-lo de vez, guardá-lo a sete chaves, como uma relíquia antiga, e não despendendo dinheiros inutilmente (tal como os valioso tesouros doados ao concelho e guardados há talvez mais de duas dezenas de anos, sem ninguém poder pôr a vista em cima)?
Senhor Presidente do Movimento. Não será possível pôr em marcha um movimento (e fazendo jus ao nome da nossa Associação…) para repensar o que se pretende com o futuro da vila de Góis? Isto é, pôr os goienses pensantes a discutir o estabelecimento de um projecto em que seja claramente traçado o seu rumo e que comprometa a comunidade. Os goienses ficar-lhe-iam agradecidos.
Claro que propor é muito fácil. Mas realizar o quase impossível, como bem sabe, dá um enorme prazer.
Lisboa, 12 de Novembro de 2007
João Barreto Nogueira Ramos
in www.portaldomovimento.com
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